Para onde vai a sustentabilidade corporativa no Brasil

Para onde vai a sustentabilidade corporativa no Brasil

Do greenwashing ao ESG de Impacto, modelo de governança passa por amadurecimento e abre caminho para empresas do país se destaquem no cenário internacional

Após uma longa jornada, a sustentabilidade se consolida como tema central e inescapável nas discussões da alta direção das empresas. Tanto nos conselhos administrativos quanto nas equipes executivas. Desde a estratégia até a operação, todas as áreas devem estabelecer metas e processos alinhados aos princípios de ESG. Um conceito que traz impacto direto na geração de valor para o próprio negócio.

Essa tendência tornou-se mais evidente durante a pandemia de Covid-19, no final de 2020 e início de 2021, quando fundos de investimento internacionais, como o BlackRock, assumiram publicamente os princípios ESG como pré-condição para empresas investidas. Esses critérios passaram a ser decisivos na classificação das companhias em níveis de investimentos financeiros, influenciando diretamente as decisões de compra e a composição de portfólios.

Esse movimento tem raízes que remontam ao final dos anos 1950, com o surgimento da responsabilidade social corporativa, que se intensificaram até a virada deste século. Diversos fatores têm impulsionado essa tendência, incluindo os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, legislações europeias e brasileiras, e as diretrizes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para empresas de capital aberto (ECAs), que são incentivadas a adotar práticas sustentáveis devido a riscos associados à reputação e imagem. 

Esse processo é contínuo e  irreversível, mas não se trata de uma transformação instantânea na índole das empresas, mas sim de uma evolução na gestão corporativa. Enquanto o lucro permanece como um fator determinante, observa-se que os stakeholders com poder de decisão estão cada vez mais inclinados a utilizar parâmetros ESG como critério para suas escolhas, pressionando as empresas a adotarem essas práticas.

Toda este movimento se reverteu em ações práticas, permeando todo ambiente corporativo, 

criando um círculo virtuoso. Grandes empresas, que lideram cadeias de valor, exercem uma influência significativa sobre seus fornecedores, propagando as práticas de ESG por toda a rede. A corresponsabilidade legal e financeira em relação aos riscos e incidentes se tornou um tema de grande relevância. As empresas precisam monitorar e apoiar ativamente suas cadeias de fornecimento para garantir o cumprimento dos padrões éticos e de sustentabilidade.

Compromissos públicos aumentam a cobrança do mercado

A realidade impõe que não podemos mais tratar a gestão ambiental, social e de governança como elementos separados da estratégia empresarial. O fenômeno do “greenwashing” , jargão criado para definir empresas que tentam adotar práticas superficiais ou marketeiras, torna-se cada vez mais desafiador para as empresas de grande relevância.  Um exemplo disso é o caso das Lojas Americanas, cujo processo e investigação pela CVM e pela Justiça Brasileira ainda estão em andamento. A empresa, que antes era vista como modelo em termos de sustentabilidade, enfrentou sérias acusações de má gestão.

A Vale é um outro exemplo de empresa que sofre frequentes questionamentos, pois apesar dos trágicos acidentes em Mariana e Brumadinho, conseguiu  recuperar reputação no mercado devido a contingências de mercado, mantendo bons parâmetros de gestão. No entanto, há sérias críticas quanto à sua postura em relação à reparação dos danos causados, principalmente no que diz respeito às vidas perdidas.

Desafios do Brasil

O Brasil apresenta um cenário promissor, equiparável aos grandes centros mundiais em termos de gestão sustentável. Embora ainda estejam em transição, existem exemplos notáveis de empresas brasileiras que atendem ou até superam os parâmetros internacionais de sustentabilidade. Levantamento da Korn Ferry revelou que 67% das empresas no Brasil já adotaram o ESG como pilar estratégico.

Há uma crescente consciência por parte dos consumidores e parâmetros legais que influenciam o ambiente de negócios. A regulamentação do mercado de carbono no Brasil, por exemplo, terá um impacto significativo, assim como as recentes regulações sobre biogás e biometano.

Em termos de parâmetros de indicadores, no Brasil, a adoção do GRI (Global Reporting Initiative) foi bastante relevante para esta mudança nas empresas e deverá continuar sendo um referencial. No entanto, o SASB (Sustainability Accounting Standards Board) ganha terreno e sinaliza mudanças futuras, possivelmente tornando o cenário ainda mais complexo e desafiador para as empresas que tentam evitar a adoção desses padrões de sustentabilidade. São elementos que mostram como o mercado brasileiro está mais maduro e comprometido em implementar as melhores prática na gestão de práticas ESG. 

No entanto, ainda é incipiente o reconhecimento e a recompensa para empresas que praticam uma gestão sustentável. Não se observa um prêmio tangível em termos de linhas de crédito maiores, indicações de investimento ou disposição do consumidor em pagar mais por produtos sustentáveis. E estes são fatores que acelerariam no convencimento dos gestores da importância da sustentabilidade quando confrontados com a necessidade de entregar resultados econômico-financeiros concretos.

 

Caminho sem Volta

Porém, mesmo na ausência de incentivos financeiros diretos, já se observa uma penalização para as empresas que não incorporam práticas de sustentabilidade em suas operações. Estamos diante de um caminho irreversível, impulsionado por fatores como o esgotamento dos recursos naturais e seus impactos globais, que afetam principalmente as populações mais pobres. 

À medida que uma empresa avança na integração da sustentabilidade em sua estratégia, não se trata de abandonar os indicadores econômico-financeiros ou a saúde financeira da companhia, mas sim de evitar o lucro a qualquer custo. A pressão social para que as empresas mitiguem riscos e danos potenciais é crescente e parece inalterável.

Um exemplo recente dessa dinâmica envolveu a Petrobras e a decisão de não distribuição de parte dos dividendos extraordinários. Uma facção da empresa defendia a retenção desses recursos para financiar seu ambicioso plano estratégico, que inclui iniciativas com significativos impactos ambientais e sociais, mas também vitais para a economia brasileira. A ideia era que, ao invés de um lucro de 500%, os investidores poderiam se contentar com 250%, permitindo à empresa investir em sustentabilidade.

Para uma companhia petrolífera, transformar-se numa empresa de energia limpa é um desafio imenso. Ao mesmo tempo que a capacidade de investimento desse setor pode acelerar a transição para fontes mais limpas de energia. Neste caso, a credibilidade gerada pela gestão sustentável é mais valiosa do que o lucro imediato que ela pode proporcionar.

Por último, mas não menos importante, cabe ressaltar que a gestão sustentável traz confiança aos stakeholders, mostrando que a empresa está atenta aos impactos de suas operações e busca minimizar os negativos enquanto potencializa os positivos. Os gestores precisam compreender o valor da gestão sustentável: ela gera valor agregado, pois credibilidade, reputação e imagem podem ser claramente convertidas em vantagem financeira. Uma empresa bem reputada e que opera baseada em práticas sustentáveis tende a prosperar e gerar valor aos acionistas e para a sociedade ao longo do tempo.